S. João escreve de manieira idêntica (1 Jn 1, 1-3) :
A nossa fé cristã está baseada sobre factos históricos, e não sobre fábulas, mitos, sobre História e não sobre « histórias !
A diferença entre João e Lucas é esta : João é testemunha ocular. S.Lucas não o é, mas « informou-se cuidadosamente de tudo desdes as origens », junto « dos que foram, desde o princípio, as testemunhas oculares et se tornaram servidores da Palavra » afim de que todos possam « verificar a firmeza dos ensinamentos » recebidos. S. Mateus é o éco da pregação de S. Pedro.
Se é necessário insistir no carácter histórico do Evangelho de S.Lucas, e dos outros três, é porque disso depende a firmeza da nossa fé. Hoje em dia, é costume opor o « Jesus da fé » ao « Jesus da História ». O « Jesus da fé » não teria nada a ver (ou quase nada) com o « Jesus da História », do qual se pretende que não se possa conhecer muita coisa. O « Jesus da Fé », ele, fica estrangeiro à toda a espécie de ciência, e portanto a toda qualquer credibilidade, dizem.
Aquela oposição é perigosa, pois provoca a ruína da fé cristã. Conforme uma sondagem, a metade dos Franceses têm a convicção de que a própria existência de Jesus é duvidosa, enquanto que é muito bem atestada. De nenhuma personagem da Antiquidade temos documentação histórica tão abundante. No entanto, há duvidas sobre a existência de Jesus, mas ninguém teria a mínima dúvida acerca da existência de Júlio César. Esse facto deixa-nos a sonhar, mas não é um mero acaso. É mesmo o resultado das numerosas tentativas de destruir a fé, através de « best-sellers » que se seguem por dezenas desde o fim do século 18 até hoje. Pensemos no recente « Da Vinci Code »…
O cúmulo aparece quando a fé dos crentes se deixa arrastar pela crítica dos descrentes, como se, em vez de chamar especialistas para estimar o valor artístico duma pintura ou duma composição musical, pedissem o aviso de pessoas cegas ou mudas. Os Evangelhos foram escritos por crentes para crentes, portanto um mínimo de fé é necessário para os perceber.
Hoje, as palavras do princípio de Evangelho de S.Lucas são portanto mais importantes do que nunca. Se nos esquecermos delas ou se não fizermos caso delas, a nossa fé cristã já não têm alicerces firmes e há-de desabar mais tarde ou mais cedo.
Para perceber isso, é bom ter uma ideia bastante precisa da maneira como que os Evangelhos chegaram até nós.
1. À partida há Jesus, os acontecimentos da vida dele. Não se trata de ideologia, mas de factos, inscritos na História. Esses factos realizaram-se « entre nós » : não por S.Lucas pertencer ao grupo dos amigos de Jesus, mas porque, quando escreveu o seu « Prólogo », ainda havia discípulos vivos.
2. A seguir, há o testemunho dos Apóstolos. Daqueles acontecimentos os Apóstolos foram testemunhas « oculares », não às escondidas, como quem passa depressa, ma sim « desde o princípio », isso é a partir do Baptismo até à Ressurreição.
3. Por causa disso, aqueles que viram tornaram-se « servidores da Palavra », logo a seguir ao Pentecostes : é a « passagem » do « ver » ao « dizer ». Essa passagem é muitíssimo lógica, uma vez que o Jesus que viram é o Verbo Encarnado. Por isso é que Origenes haverá-de dizer :
Se se tratasse só de matéria, Pilatos teria visto a Palavra, e Judas também, e todos quantos gritavam : « Crucifica-o ! ». Ver a Palavra de Deus, o Salvador explica o que é : « Aquele que me vê, também vê o Pai que me enviou ».
4.Estando a Tradição cristã firmemente ligada por essa Palavra dos Apóstolos ao próprio Cristo-Verbo, o papel dela é « transmitir » o que recebeu das testemunhas oculares. E o primeiro trabalho neste sentido é « escrever sobre isso um relato coerente ». Aqui também, está tudo muito lógico, uma vez que o objecto desta composição são os acontecimentos da vida e da morte de Jesus. O « valor acrescentado », se se pode falar assim, é a composição », a procura da unidade entre fragmentos diversos, o que, conforme o que diz S.Lucas, já tinha sido efectuado por alguns antes dele.
5.Aquela tradição da Palavra de Deus, encarnada em Jesus Cristo, repetida pelos Apóstolos, há-de encontrar a sua « com-posição » acabada pelo trabalho dos quatro Evangelistas. S.Lucas confia-nos qual foi o seu método : está baseado sobre uma informação « cuidadosa » (« ácribos », de que os péritos tiraram « acribia » para qualificar uma precisão científica !) « de tudo », portanto tão completa como possível, « desde as origens », isso é ,antes do Baptismo, a sua infância. Para isso, S.Lucas vai buscar nas fontes, não só nos « relatos coerentes » já redigidos por outros antes dele, mas também« nas testemunhas oculares », « os servidores da Palavra » que conseguiu encontrar, inclusivamente a Virgem Maria e demais membros da « família de Jesus »…. Tudo isso « para ti, caro Teófilo », o que significa : « para todos os futuros discípulos de Cristo, afim de que percebamos todos a firmeza dos ensinamentos (da catequese - essa é a palavra grega usada por S.Lucas) recebidos.
O que digo foi confirmado pelas pesquisas de 150 anos de exegese encarniçada acerca da formação dos Evangelhos. Temos portanto que louvar alto e forte, contra ventos e marés, os louvores da autenticidade daqueles escritos essenciais para a nossa fé !