No princípio, o neofito mostra um maravilho entusiasmo. Mas esse entusiasmo não passa, em grande parte, de ilusões bem como de ideias erradas a respeito do modo escolhido por Jesus para cumprir a sua missão messiânica. Jesus já tinha devido chamar à ordem Pedro, o autor legítimo da profissão de fé dos Doze, mas que, a seguir, tinha ousado fazer a Jesus " censuras vivas " ao ouví-lo falar em sofrimentos, rejeição, morte e ressurreição : " Os teus pensamentos não são os de Deus, mas sim os dos homens ", tinha respondido o Messias.
Hoje João é aquele cujos pensamentos são demesiado humanos, apesar de julgar agir bem ao impedir alguém de expulsar os espíritos maus em nome de Jesus : " Pois, não é daqueles que nos seguem". Antes de falar na resposta de Jesus, reparemos uma alteração significativa no modo de falar de João. Não diz : " Não é daqueles que TE seguem ", mas sim : " Não é daqueles que NOS seguem ". O erro de João é este : pensar que, para seguir Jesus, é necessário nos seguir, a NÓS, isto é : o grupo dos Doze, e que é necessario seguir de maneira material.
Essa alteração há-de ser uma oportunidade para lembrar uma verdade importante, não só para João, mas também para todos nós. Seguir Jesus, antes da Ressurreição, significava andar fisicamente atrás dele. Depois, as coisas mudaram : a presença sensível de Jesus já não é. Nestas condições, seguir Jesus recebe um sentido novo : é viver conforme os seus ensinamentsos e o seu exemplo, docilmente, no espírito filial, fruto da acção do Espírito recebido no Pentecostes. Da mesma maneira que a verdadeira família de Jesus não é uma familia carnal, assim os verdadeiros discípulos não são os mais próximos de Jesus no espaço ou no tempo. Aquela proximidade, quando existe, pode acompanhar ilusões perigosas : " Então havereis-de dizer : Nós temos comido e bebido na tua presença, ensinaste nas nossas praças. (O Senhor) responder-vos-á :Não sei donde sois. Afastai-vos de mim, vós todos que fazeis o mal " (Lc 13,26-27)
O carácter próprio do verdadeiro discípulo (podemos pensar na Virgem Maria) é uma fé activa (que se manifesta pela vida). " Quem faz a vontade de Deus, esse é quem é o meu irmão, a minha irmã, a minha mãe " (Mc 3,35) Já antes da Ressurreição, o Evangelho mostra-nos algumas pessoas bem decididas a seguir Jesus, mas que Jesus não o deixa fazer fisicamente, ao mesmo tempo que lhes explica que o essencial não está aqui.
O homem possesso no país dos Generazenos suplica-o " para estar com ele. (Jesus) não consentiu mas disse-lhe : " Vai para a tua casa, junto dos teus, anuncia-lhes todo o que o Senhor fez por ti na sua misericórdia " (Mc 5,18-19). Já para os Apóstolos e demais contemporáneos, seguir Jesus necessita mais do que um par de pernas boas. E Judás, que estava bem provido disto, não é realmente o modelo que se deva " seguir ".
O modelo a seguir é S.Paulo, ele que se tornou discípulo de Jesus só depois do Pentecostes, e que, portanto, não tinha andado atrás de Jesus, nem comido nem bebido na presença dele.
Ao escrever aos cristãos da comunidade que tinha fundada em Filipes, ele aponta no que é o mais importante : " Tende entre vós as disposições que se devem ter em Cristo Jesus : Ele, que era na condição de Deus, não quis reivindicar o seu direito de ser tratado como igual de Deus " (Fil 2,5). Aqui está o que " seguir " quer dizer.
Precisamente, no Evangelho deste dia, a quem chamam " discurso comunitário ", em S.Marcos, Jesus censura João, que o seguia de muito perto, fisicamente, com os outros Onze, mas que ficava muito longe de ter as disposições que se devem ter em Cristo Jesus. S.Marcos contou-nos que, junto com o seu irmão Tiago, já se tinha manifestado anteriormente partidário de métodos bastante drásticas. Jesus tinha-os qualificado de " filhos do trovão " (Mc 3,17). Ora, o mesmo João escandaliza-se por ter visto " alguém expulsar espiritos maus " em nome de Jesus, apesar de não ser daqueles que nos seguem. Nós quisemos impedí-lo " diz sem precisão do método usado. Jesus faz perceber a João que, na verdade, ele é quem não segue, quem apesar de seguir Jesus fisicamente, não tem " as disposições que se devem haver em Cristo Jesus ", enquanto que o outro, o que João olhava como ume pessoa importuna, se " não está contra nós " e se pelo contrário oferece aos que estão com Jesus " mesmo que seja só um copo de água em nome da sua pertença a Cristo ", aquele " não ficará sem recompensa ".
Aqui ainda, S.Paulo mostra-nos o exemplo a seguir ao prosseguir mais longe naquele lógica da verdadeira tolerância, ao contrário do espírito sectário. Na carta aos Filipenses, só alguns versículos antes do trecho acima citado, escreve : " Alguns anunciam Cristo com a segunda intenção de me prejudicar, mas outros fazem-no sinceramente ; de qualquer modo, uma vez que Cristo é anunciado, alegro-me, e alegrar-me-ei sempre " (1,18), portanto mesmo que não recebam deles o mínimo copo de água, mesmo que estejam contra ele.
O que importa, não é a relação : " alguns "-Paulo, mas sim a relação " alguns "-Jesus . (Reparemos no entanto que se trata daqueles que " anunciam Cristo ", e daqueles que " realizam milagres ". Fala-se muito facilmente para os aplicar ao diálogo interreligioso, portanto com aqueles que não actuam em nome de Cristo. Não é totalmente a mesma coisa (Cf. G.S. 44)
Quão lenta é nossa disposição para tornar nossos os sentimentos de Cristo Jesus ! No entanto, Deus tinha começado desde havia muito tempo a ensiná-los aos que o queriam seguir (cf. 1a Leitura).
Hoje, isso também faz questão na colaboração entre o Bispo e o seus sacerdotes. A tradição cristã sempre viu na efusão do Espírito de Moisés sobre os 70 anciãos uma figura da participação dos sacerdotes na missão sacerdotal, real e profética do Bispo. Está bem visto, da parte dum bispo dicesano, ter um " projecto pastoral ", elaborado ou não por ocasião dum sínodo diocesano. Às vezes manifesta-se a tendência a usar desse documento para contrariar toda a iniciativa julgada inadequada, não de acordo com o projecto pastoral, exactamente como se o Espírito Santo tivesse obrigação de respeitar os planos dos homens.
Na Encíclica " Tertio millenio ineunte " (n.29) João Paulo II convidava os cristãos para " partir novamente de Cristo " ; escrevia : " Não se trata então de inventar um programa novo. O programa já existe : é o de sempre, o que vem do Evangelho e da Tradição viva. Centra-se, finalmente, no próprio Cristo, que deve ser conhecido, amado, imitado, afim de viver nele a vida trinitária e transformar com ele a história até ao seu fim na Jerusalém celeste. " Quem teima em tudo programar , organizar, canalizar, corre o risco de se esquecer da primazia da graça : " Há uma tentação que espreita desde sempre todo o caminho espiritual e a própria acção pastoral : a de estimar que os resultados só dependem da nossa capacidade de fazer e de programar. " (n.38) Não será a mesma mania que já manifestava João e que Jesus queria arrancar ?
Isto alarga a questão do exercício dos carismas (como os da profecia e do exorcismo) pelo " povo de profetas ", isso é : todos os baptizados. Nenhuma planificação pastoral tinha previsto a eclosão da Renovação Carismática. Os pastores da Igreja so puderam maravilhar-se e acompanhá-la com prudência, (tal como S.Paulo em Corinto) afim de evitar todos os excessos. Mas, apesar disso, não foram poucos, " os filhos do trovão " que manifestaram muito zelo e acharam que era necessário, " impedir" espalhar-se o fogo que Jesus veio acender na terra (cf. Lc 1,49) Pelo contrário, podemos verificar uma espécie de sectarismo da parte dos membros da " Renovação ", ao julgar que tudo passa pela " Renovação Carismática " e que fora dela não há salvação possível. A Acção católica conheceu também ela esse erro
A continuação do Evangelho lembra-nos que, se a tolerância e o respeito têm de presidir a tudo quanto se realiza em nome de Cristo, o próprio Cristo pede, pelo contrário, um rigor (ou intolerância) extremo quando se trata daqueles que provocam um escândalo dentro da comunidade, especialmente quando se diz respeito aos pequenos e aos fracos.
Aliás S.Marcos aponta sempre na fraqueza do crente. Para ele, quem segue Jesus fica sempre fraco e pequeno.
Esse rigor-intolerância deve primeiro exercer-se para si próprio. Pois quem empreendeu seguir Jesus pode provocar primeiro a sua própria ruina. Não devemos muito depressa adoçar nem diminuir as palavras tão radicais de Jesus. Quantos morreram num banho de sangue para não se comprometer com a manifestação do mal. Não devemos pensar que as oportunidades de praticar este radicalismo aparecem só em casos extremos. O martírio está presente também na vida de todos os dias, por exemplo na mortificação da lingua ou do olhar. " Cada quel será salgado pelo fogo ", qualquer for o modo. Por altura do baptismo, a renuncia " a Satanás, ao pecado e a todo o que leva ao mal " precede a pofissão de fé. Não nos esquecemos disso.
Aquele radicalismo, como diz S.Francisco de Sales, não exclui uma paciência igualmente necessária para consigo próprio. A arte de seguir Jesus pela imitação dele, graças ao Espírito Santo implica também o difícil equilíbrio entre tolerância, rigor e paciência. Votos aos casados assim!!